Patrimônio Natural da Humanidade, a região do Parque Nacional do Pantanal vem sofrendo uma nova e agressiva invasão de pescadores.
Rios, corixos, baías e outras áreas protegidas se tornaram o destino prioritário de barcos-hotéis de grande porte, que partem principalmente de Corumbá (MS) e espalham turistas e seus apetrechos de pesca por toda a região. A pesca profissional também se intensificou.
O descontrole se instalou nos últimos cinco meses, nas brechas abertas por um conflito entre agendas social e ambiental do qual tomaram parte ONGs, comunidades tradicionais, órgãos públicos de proteção ao Meio Ambiente e o Ministério Público Federal.
Uma disputa que lançou dúvidas sobre a validade de áreas de proibição à pesca já consolidadas e agora ameaça estoques pesqueiros protegidos não apenas nos 135 mil hectares do parque, mas também nas cinco RPPNs (Reservas Particulares do Patrimônio Natural) de seu entorno.
Comunidades ribeirinhas da região, com o apoio da Procuradoria da República, acusam as reservas particulares de vetar acesso a áreas de ocupação tradicional e à prática de atividades como a pesca artesanal e a cata de iscas-vivas. Defendem, inclusive, a revisão dos limites das áreas protegidas.
As ONGs questionam o caráter "tradicional" das comunidades, afirmando que sua atuação hoje se destina à pesca profissional e ao atendimento à demanda por iscas do trade turístico, principal beneficiário do afrouxamento nos limites impostos à atividade no local.
A convite de um destes atores, a ONG cuiabana Ecotrópica (que detém quatro das RPPNs em discussão), a reportagem do DIÁRIO acompanhou uma ação de monitoramento e constatou a atuação de ao menos seis grandes barcos-hotéis e dezenas de pequenas embarcações de pesca esportiva e profissional nos arredores do parque e dentro de uma das reservas.
A entidade afirma que a situação se agravou após a adoção de um posicionamento "dúbio" por parte da nova coordenação-regional do ICMBio (Instituto Chico Mendes), órgão encarregado da gestão e fiscalização do parque e do apoio à proteção das RPPNs.
"A nova coordenação passou a relacionar a condição de vida no entorno das unidades à própria existência das unidades, o que é um erro", critica o advogado Ilvanio Martins, presidente da Ecotrópica.
Segundo ele, a visão estritamente "social" do órgão vem se sobrepondo à legislação ambiental e aos objetivos de preservação. "É uma nuvem de desinformação perigosa, que só interessa à indústria multimilionária da pesca".
O momento crucial deste novo cenário ocorreu em abril passado, em uma reunião entre as partes realizada na comunidade da Barra do São Lourenço, localizada nas imediações do parque e que reúne cerca de 100 moradores.
À ocasião, o coordenador-regional do ICMBio, Fernando Francisco Xavier, relatou mudanças nas normativas do órgão em relação às zonas de amortecimento das unidades de conservação.
O novo entendimento, segundo ele, tornava sem efeito legal a portaria que instituiu, entre outras regras, as zonas de proibição à pesca no entorno do parque.
A fala foi compreendida e disseminada rapidamente pela região como um salvo-conduto. Tanto é que, um mês mais tarde, o instituto se viu obrigado a publicar uma nota de esclarecimento em relação a "informações erroneamente veiculadas".
"Não foi feita qualquer 'liberação' da pesca no Pantanal (...) A zona de amortecimento do PNPM [Parque Nacional do Pantanal Mato-grossense] tem validade técnica imprescindível", afirmava a nota, em um trecho.
O esclarecimento, aparentemente, não chegou aos confins do Pantanal. Durante a ação de monitoramento, a reportagem acompanhou um diálogo entre o piloto de um barco (que conduzia dois turistas) e um dos funcionários da ONG.
“Aqui virou reserva?”, questionou o piloto, que naquele momento navegava pelo interior da RPPN Penha, criada em 1997.
Fonte: diariodecuiaba.com.br/
Nenhum comentário:
Postar um comentário